PRESENTE DE ANIVERSÁRIO
Katy iria completar dez anos.
Seus pais pensavam no que lhe
dariam de presente, algo que como sempre fosse de sua própria escolha e agrado.
Na dúvida, optaram pela
diferença: escolher-se-ia uma surpresa que a tornasse plenamente feliz.
Estava difícil, sua filha, garota
sensível, tinha de quase tudo que preenchiam os seus prazeres de pré adolescente, como
todos eles, moderna e exigente. Bonecas, em coleções. Bijouterias jovens, kits de
pinturas anti alérgicas, caixa de música, roupas, calçados da moda, jogos de diversão,
coleções, cds, etc. Parecia-nos que não faltava nada.
Quem sabe alguma coisa do tipo
importado, sugeriu o pai, Katy é alguém tão refinada quanto a mãe, adora
exclusividades...
Melhor não, respondeu a mãe, pode
acontecer o que já se passou quando fez sete anos, que mandamos trazer dos Estados
Unidos, por uns amigos, um par de patins - coqueluche do momento - e o padrinho acabou se
antecipando à nossa surpresa dando-lhe o cobiçado par de patins!
Ainda hoje soa aos meus ouvidos ,
sua "madura" advertência
- Antes de comprar, não deixem de
me consultar, pois o tio Aílton já me perguntara o que queria ganhar. Agora o que é que
faço com dois patins iguaizinhos, ainda por cima da mesma cor... alaranjado?
- Você pode vender um deles, minha
filha, ou então presentear uma amiga muito querida...
- Está louca, mamãe, disse Katy,
jamais doei algo que tenha ganho...
É!. Tenho que admitir, ela tinha
lá seus argumentos, com os quais a mãe sempre se identificara, nalguma lógica
sentimental...
E foi neste vaivém de visitar
vitrines, consultar revistas de sugestões, ouvir opiniões as mais diversificadas
possíveis, até da empregada, que estava com a família há longos anos, desde o
aniversário dos 4 anos da filha..
Foi oportuna a sua sugestão, que
na época, Júnior, o filho mais velho, aprovou entusiasticamente:
- Podíamos fazer um bolo surpresa,
o presente viria embutido, e na hora do parabéns... Ula-lá, seremos todos presenteados
com aquele brilhinho no olhar e aquele risinho fofo( Katy nesta idade era uma jovenzinha
fofinha e dengosa...)
Optou-se pelo método exclusivo, e,
uma a uma, as sugestões iam sendo, ora revistas, ora substituídas, na incansável
tentativa de acertar de vez a escolha.
Foi durante o horário de almoço,
véspera do dia 30 de janeiro, que seria o Dia D+, (como a garotada designava um dia muito
especial), que resolveram os pais, com a aprovação total do filho , de 11 anos, que no
dia seguinte, bem cedo, a garota teria, já ao se levantar, o seu inesquecível presente.
E haveria de estar muito feliz,
como todos queriam que estivesse, não só neste, mas nos dias futuros, em toda a sua vida
( pais costumam ver numa distância tridimensional!) ,plenamente satisfeita com seu belo
presente.
Terminada a refeição, foram todos
ao centro da cidade e por ali escolheram a tradicional e, por incrível que pareça, o
mais moderno shopping - " Au-au e Cia." e lá dentro, entre tantos animais de
todas as raças, portes, tipos, etc., selecionaram exatamente o que procuravam para
presentear a aniversariante.
É possível afirmar que esta é
uma escolha não muito fácil de se acertar, quando não se tem certeza dos sentimentos
nutridos nesta faixa etária: carinho, receio, ou até mesmo, nenhum sentimento. Eram
todos eles, pássaros, cães, gatos, lindos e cativantes, podiam perfeitamente
identificar-se em estilo, com a talentosa Katiane.
Gaiolas em gaiolas, iam todos,
comparando, admirando, e de certa forma já se envolvendo com aquele que seria o primeiro
animalzinho de estimação não só da aniiversariante, como de todos os membros da casa,.
Começou-se ali mesmo, em meio a
tanto barullho, o traçado dos planos quanto à alimentação, recinto de permanência,
locais de passeio, etc, etc.
O nome, este não se poderia nem
pensar em tirar da presenteada o privilégio de escolhê-lo.
E foi assim, com enorme dificuldade
quanto à escolha de um lindo filhote de gato Persa, e um badalado canídeo, que optou-se
por uma cadelinha de apenas 40 dias, de raça Dashund (ou basset alemã), pelugem canela,
olhos e focinho claros e um inesquecível e meigo olhar, numa reciprocidade inconfundível
dos que encontram o que procuram.
Manhã do dia 30 de janeiro de
1990. A casa silenciosa, envolta pelo canto barulhento dos pardais nos fios da rua,
despertaram todos, pais, filho, empregada, e se dirigiram à loja buscar o presente da
garota.
Confesso, sem sombra de erro, que
este foi um dos mais bonitos aniversários festejados com a família, parentes e amigos,
em que como tia, me vi presente entre os convidados.
Na hora em que Katy despertou, em
torno de 9:00 horas, eu que já na casa me encontrava, vindo de viagem no dia anterior,
convidamo-la para achegar até à edícula onde se alojava a empregada, nos fundos da
casa.
Em lá chegando, pusemo-nos a
cantar o primeiro "Parabéns a você" do dia, enquanto admirávamos o olhar
intrigado de nossa aniversariante, diante daquele enorme presente embrulhado com
laçarotes e fitas envolto por cartões desenhados pelo computador.
No alto da caixa, o que chamou a
sua atenção foram os dois buracos , que ela própria preferiu conferir bem de perto, ao
invés de disparar perguntas, naquela ousadia que conheço bem, lhe era peculiar, quando
se tratava de desvendar enigmas.
Foi se chegando mais e mais e de
repente, o susto!... Katy saltou ao nosso lado.
Depois o riso, e finalmente o
olharzinho brilhoso, bem como descrevera Dalva, que a mimava em tudo.
Um latido discreto, fez com que
Katiane rasgasse rapidamente todo o invólucro de papelão e lá de dentro, como
onomatopeicamente dizia a canção do Roberto: "Seu cachorro lhe sorriu
latindo..."
Confusa e feliz, não sabia se
tomava ao colo o animalzinho, ou se deixava alguém fazê-lo, pois todos eram profundos
conhecedores de seus receios por cães, motivo pelo qual nunca pensaram ter um naquela
casa.
O papai João, decidido como
sempre, resolveu auxiliá-la na aproximação, e, quando o animal acenou o rabo, com
trejeitos de satisfação, Katiane se aproximou mais descontraída para o primeiro afago.
Começou ali mesmo a pesquisa do
nome e, após algumas sugestões, optou-se por aquele aprovado por todos os familiares -
"Babie Picchie".
Logo em seguida, foram, pais e
filhos, levá-la ao veterinário, para os primeiros cuidados com a saúde e higiene.
À hora exata de partir o bolo de
seus 10 anos, Katy derramou suas tardias lágrimas de emoção e tratou de separar para
sua nova companheirinha, uma fatia do bolo, bem como alguns salgadinhos, com as oportunas
lembranças de que não exagerasse na dose, para não atrapalhar sua alimentação de
bebê.
O padrinho achou que não haveria
mal se fosse oferecida uma pequena quantidade, o que minha sobrinha fez com muita alegria.
Hoje, quatro anos se passaram, e a
alegria daquela data ainda persiste, cada vez que revejo a delicada e meiga Katiane
alimentar ou afagar Babie, que hoje já é mamãe pela segunda vez (conservaram desta cria
uma filhote puríssima, de nome Kíria, que quer dizer "alegria").
Quando vista, às voltas com suas
ilusões de adolescente, folheando a agenda e as fotos de seus ídolos, a mãe me diz,
chega a pensar que as maiores alegrias de sua existência, foram, na maioria das vezes,
aquelas não programadas, mas que vividas, a seu momento, com inteira disponibilidade
interior.
Aceitando com desprendimento que a
natureza - espontânea e bela, nos traz a confiança necessária para se prosseguir em
frente, fazemos de nossas experiências (todas elas!) , molas propulsoras para uma fase
seguinte.
Hoje, Katy, uma jovem notável,
curte, além da Babie Picchie - o novo ídolo de sua geração - Brad Pitt, cuja
semelhança fonética por ela já foi observada.
Resta-me concluir que, a vida,
acima das respeitadas diferenças, insiste, e, curiosamente, preserva algumas
semelhanças!...
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